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quinta-feira, 8 de março de 2012

EM HOMENAGEM AO DIA INTERNACIONAL DA MULHER, NOSSO BLOG FAZ UMA HOMENAGEM AS MULHERES QUE JÁ INTERPRETARAM SAMBA ENREDO NA AVENIDA COMO CLARA NUNES, LECY BRANDÃO, TIA SURICA, ELZA SOARES ENTRE OUTRAS DIVAS.

  
Clara Nunes e Simone, duas das que puxaram samba na avenida, posam com Emílio Santiago

As mulheres têm uma importância vital para o carnaval. Seja pela beleza e graça das mulatas, passistas e atrizes-modelos-e-manequins que viraram madrinhas de baterias ou pela arte desenvolvida pelas baianas e portas-bandeiras. Mas as mulheres protagonizam outras funções igualmente nobres nas escolas, como bordadeiras, costureiras, ritmistas e até exercer o cargo máximo de uma entidade carnavalesca – a presidência. Na força do cantar, na condução de uma escola de samba, as mulheres também exercem um papel de destaque. Infelizmente, esta prática é bem menos freqüente do que no caso dos homens.
No final da década de 40, época em que datam os primórdios do samba enredo (samba que contava a história de um tema único), um sambista oriundo da escola conduzia uma parte da música e um coral, predominantemente feminino entrava nos refrões. Eram as pastoras: um coro formado por mulheres, inspirado no grupo que acompanhava o cantor Ataulfo Alves. As pastoras geralmente faziam as vozes em terça, ou seja, num tom alto, lembrando o canto bonito e ao mesmo tempo melancólico das lavadeiras. No entanto, é difícil dizer com precisão qual foi a primeira puxadora de samba.
Uma das precursoras foi, sem dúvida, a Tia Surica (Iranette Ferreira Barcellos, 1940 - foto acima). Aos 4 anos, já desfilava pela Portela acompanhada pelos pais. O apelido foi dado por sua avó, quando ela ainda era pequena. “Surica” é um adjetivo usado para roupa curta, por encolhimento. Quem conhece Iranette e seu 1,47m sabe que o apelido lhe cai como uma luva. Em compensação, o que lhe falta em altura, sobra em talento e alegria. Em 1966, ao lado de Maninho e Catoni, puxou o samba-enredo “Memórias de um Sargento de Milícias”, de autoria de Paulinho da Viola. Pertence à Velha Guarda da Portela desde 1980. Sua casa, conhecida como o “Cafofo da Surica”, é palco de festas memoráveis. Tia Surica tem um CD lançado (2003), com um repertório que reúne a elite dos compositores da Portela, como Monarco, Chico Santana, Aniceto, Casquinha, Manacéa, entre outros.
Em 1969, para comprovar que não era nem melhor, nem pior, apenas diferente, a Acadêmicos do Salgueiro contratou Elza Soares (foto acimaver ficha avulsa) para conduzir o samba “Bahia de todos os deuses”. Elza já era uma sambista consagrada no Brasil e no mundo e ajudou o Salgueiro a conquistar o quarto campeonato da escola e, ao mesmo tempo, derrubar uma pecha: até aquele momento, nenhuma entidade que desfilara tendo como enredo a Bahia no carnaval carioca havia levantado a taça. O sucesso da cantora na vermelho e branco inspirou outras escolas a buscarem “a sua Elza”.
Em 1972, o Império Serrano contratou uma legendária cantora da época de ouro do rádio. Marlene (Vitória Bonaiutti De Martino, 1924 - foto acima) havia participado em 1968 do show Carnavália, uma antologia do carnaval, com a participação de Eneida de Moraes, Blecaute, Nuno Roland e Índio e seu Conjunto. No ano seguinte, recebeu o Troféu Carmem Miranda, criado para premiar os melhores intérpretes de carnaval nos concursos promovidos pelo Museu da Imagem e do Som e patrocinados pela TV Tupi e Secretaria de Turismo do Rio de Janeiro. Para cantar “Alô, alô, taí Carmem Miranda”, a verde e branco da Serrinha não pôde contar com Roberto Ribeiro, que tinha se afastado da escola. Marlene não se intimidou e conduziu com maestria a escola, ajudando o Império a conquistar o título daquele ano. A cantora repetiria a dose em 1973, com “Viagem fantástica Pindorama a dentro”.
A partir daí, houve uma febre de puxadoras de samba. No disco dos sambas enredo de 1973, o samba da Unidos do Jacarezinho é cantado por Ivete Garcia. Ainda no mesmo ano, Graciete, sambista imperiana, gravou o samba da verde e branco de Madureira pela impossibilidade contratual de Marlene pôr sua voz no disco. Outras cantoras defenderam sambas nas escolas nos grupos de acesso.
Beth Carvalho (Elizabeth Santos Leal de Carvalho, 1946 - acima, com Dona Ivone Lara), ingressou no mundo do samba ao gravar, em seu LP de 1971, o samba-enredo da Unidos de São Carlos, “Rio Grande do Sul na festa do preto forro”. Logo a seguir, lançou pela Tapecar o compacto simples Amor, amor, samba do bloco carnavalesco Bafo da Onça. Oriunda da bossa nova, da zona sul do Rio, porém mangueirense de longa data, Beth freqüentava as rodas de samba dos quintais e subúrbios, o que lhe rendeu o apelido de “Enamorada do samba”. Como pertencia ao cast da Tapecar, mesmo selo do LP oficial dos sambas enredo, a cantora gravou “Mangueira em tempo de folclore”, samba da verde e rosa para o carnaval de 1974, devido à impossibilidade contratual do titular Jamelão. Em diversas oportunidades, Beth Carvalho auxiliou Jamelão na condução dos sambas da Manga na avenida. No carnaval de 1984 – o primeiro da era Sambódromo – foi homenageada pela Unidos do Cabuçu, com o enredo "Beth Carvalho, a Enamorada do Samba". Aliás, naquele ano, Beth foi a autêntica pé-quente, pois ganhou nas três escolas em que desfilou: Cabuçu (campeã do Grupo 1-B), Portela (campeã do desfile de domingo do Grupo 1-A) e Mangueira (campeã do desfile de segunda-feira e supercampeã do carnaval).
Outro símbolo do samba foi Clara Nunes, fotos acima, na direita cantando junto com Dominguinhos do Estácio, Bira da Mangueira e Conjunto Nosso Samba em 1977 (1943-1983). Iniciou a carreira como crooner de boates. Na década de 60, vencia todos os concursos musicais em Minas Gerais, seu estado natal. Em 1965, se transferiu para o Rio de Janeiro e foi contratada pela gravadora Odeon. Antes de aderir ao samba, tinha um repertório indefinido, em que cantava boleros, serestas e até bossa nova. Em 1968, ao gravar “Você passa eu acho graça”, Ataulfo Alves e Carlos Imperial, fixou sua presença no mundo do samba. Em 1971, gravou dois sambas enredo: “Misticismo da África no Brasil”, da Império da Tijuca, e “Festa para um rei negro”, do Salgueiro, além de “Ê baiana”, de Miguel Pancrácio, Ênio Santos Ribeiro, Fabrício da Silva e Baianinho da Em Cima da Hora, que fez estrondoso sucesso no carnaval daquele ano. No LP do ano seguinte, Clara regravou “Seca do Nordeste” (Gilberto Andrade e Waldir de Oliveira), clássico da Tupy de Brás de Pina no carnaval de 1961, e “Ilu-ayê” (Cabana e Norival Reis), que marcou a sua aproximação com a Portela. A partir daí, a carreira de Clara Nunes decola definitivamente, batendo recordes de vendagem, graças às composições inspiradas de bambas, como o seu marido Paulo César Pinheiro, João Nogueira e Mauro Duarte e o grupo Nosso Samba, responsável pelos arranjos nos discos e pelo acompanhamento musical nos shows. Em 1975, a cantora puxou na avenida o samba enredo “Macunaíma”, (Norival Reis e David Corrêa). Com ela, no carro de som, estavam o próprio David Corrêa, o compositor Candeia e o puxador oficial da escola, Silvinho do Pandeiro. Clara também abriu as portas para o sucesso de músicas que tinham o formato de samba enredo, como “Canto das Três Raças”, “Portela na avenida” e “Serrinha”, de Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro, e “Nação”, de João Bosco, Aldir Blanc e Paulo Emílio. Clara Nunes faleceu no Sábado de Aleluia de 1983, após uma cirurgia malsucedida, depois de 28 dias no CTI. Seu corpo foi velado por mais de 50 mil pessoas na quadra da escola de samba Portela. Em sua homenagem, a rua em Madureira onde fica a sede da Portela, sua escola de coração, recebeu seu nome. No ano seguinte, a Portela levou à Sapucaí o enredo “Contos de Areia”, uma homenagem à cantora e a dois portelenses legendários, Natal e Paulo da Portela.
Em 1976, o Salgueiro retorna com uma mulher no carro de som. A sambista Dinalva gravou “Valongo” no disco oficial da gravadora Top Tape e ainda dividiu o microfone com os puxadores oficiais do Salgueiro da época, Noel Rosa de Oliveira e Joel Teixeira. Em 1980, Zaíra foi a voz da Unidos de São Carlos no samba “Deixa Falar”. Durante a década de 80 houve uma retração na escolha de mulheres para puxar os sambas.
O ressurgimento de uma mulher com papel de destaque no carro de som de uma escola de samba ocorreu em 1989. A cantoraSimone (Simone Bittencourt de Oliveira, 1949, posando acima com Martinho da Vila, Milton Nascimento e Paulinho da Viola) foi convidada pela Tradição para dividir a condução de “Rio, samba, amor e tradição” com o puxador Kandanda. Tanto a escolha de seu nome quanto o desempenho da cantora baiana foram bastante criticados. No entanto, a intérprete não era nenhuma estranha no ninho. Após 10 anos de carreira com repertório calcado na MPB tradicional, Simone regravou “O Amanhã” (João Sérgio) – samba da União da Ilha do Governador de 1978 –, para o disco Delírios e delícias (1983). A música bateu recordes de execução nas rádios e programas de tevê. No ano seguinte, a cantora fez um bate bola com Neguinho da Beija-Flor: ela cantou no disco dele, Ofício de Puxador (1984), a faixa “Deusa da Passarela”. Em seguida, o intérprete de Nilópolis participou da gravação de “Por um dia de graça” (Luiz Carlos da Vila), para o disco Desejos (1984) da Cigarra. A partir daí, graças à ótima repercussão, Simone sempre passou a incluir um samba enredo no repertório de seus discos e shows. No LP seguinte, Cristal(1985), ela aproveitou a carona no sucesso obtido pela Caprichosos de Pilares no carnaval daquele ano: encomendou aos autores de “E por falar em saudade” Almir de Araújo, Balinha, Hércules Correia, Marquinho Lessa e Carlinhos de Pilares um samba que tivesse a estrutura parecida com o que foi levado à Sapucaí, convidou o puxador Carlinhos de Pilares para dividir os vocais e teve o auxílio luxuoso da bateria da escola. O resultado foi o sambaço “Amor no coração”, apontado como a melhor gravação de um samba enredo em um disco de Simone. Depois disso, a cantora ainda gravaria outras músicas nesse gênero: “Rei por um dia” (1986), “Disputa de poder” (1988), “Louvor a Chico Mendes” (1989) e “Liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós” (1990).
Depois de Simone, outras duas cantoras estiveram mostrando a força e a capacidade das mulheres para puxar samba enredo no mesmo ano de 1995. O vozeirão de Selma Reis esteve a serviço da Mocidade Independente de Padre Miguel como apoio de Wander Pires. Selma, considerada uma cantora de repertório sofisticado, não poupou esforços para ajudar a cantar o belíssimo samba “Padre Miguel, olhai por nós”.
Nascida e criada nas proximidades de redutos do samba carioca, como a Portela, Vila Isabel e Mangueira, Leci Brandão (Leci Brandão da Silva, 1944, foto acima) começou a atuar como cantora e compositora na década de 1960, e em 1968 ganhou o primeiro prêmio do programa A Grande Chance, da TV Tupi. Em 1972 entrou para a ala dos compositores da Mangueira, sendo a primeira mulher a conseguir esse feito. Concorreu na quadra diversas vezes. No entanto, nunca venceu uma disputa na verde e rosa, tirando o segundo lugar em três oportunidades – a última para o carnaval de 1998, com o tema “Chico Buarque da Mangueira”. Participou de festivais de MPB e samba, e lançou o primeiro LP em 1975, Antes que eu volte a ser nada. No início da década de 80 brigou com a gravadora Polygram e ficou cinco anos sem gravar, época em que acentuou-se sua atuação política, ligada ao sindicalismo, aos direitos humanos e às minorias. Também foi o período em que desenvolveu sua carreira no exterior, apresentando-se no Japão, Dinamarca, Angola, Estados Unidos. Voltou a gravar em 1985, pela Copacabana. A partir daí, sua carreira musical deslanchou e firmou-se como um dos nomes mais fortes do samba no país. Em 1990, seu disco Cidadã Brasileira ganhou dois prêmios Sharp. Leci Brandão atuou quase 10 anos como comentarista dos desfiles do carnaval carioca pela Rede Globo, onde sempre destacava a aparição dos sambistas, o que lhe rendeu o apelido de “Leci Comunidade”. Há três anos vem comentando os desfiles do carnaval de São Paulo. Em 1995, foi convidada para puxar “Deuses e costumes nas Terras de Santa Cruz” para a Acadêmicos de Santa Cruz, no Grupo de Acesso. O samba conquistou o Estandarte de Ouro do jornal O Globo. Antes de começar a cantar o samba, Leci homenageou vários puxadores, citando gritos de guerra consagrados, como “chora cavaco”, “dá licença”, “vai meu ritmo”, “beleza, beleza, beleza” e “segura a marimba”. Em seus discos, também há espaço para revisão de sambas enredo antigos, como “Dona Bêja, feiticeira de Araxá”, “Histórias de um preto velho” e  “Casa Grande e Senzala”.
A maranhense Alcione (Alcione Nazaré, 1947), junto com Beth Carvalho e Clara Nunes formou o ABC do Samba nos anos 70. Mangueirense desde que chegou ao Rio de Janeiro, nos anos 60, Alcione tem apenas uma experiência como puxadora de samba: no CD oficial de 2004 ela gravou “Contos de Areia” samba que a Tradição reeditou naquele ano na Marquês de Sapucaí, mas não defendeu na avenida. A diretoria da escola do bairro do Campinho escolheu a Marrom devido à sua grande amizade com Clara Nunes. Alcione foi enredo da escola de samba Unidos da Ponte no carnaval de 1994.
E neste texto sobre as puxadoras, não poderia faltar o nome de um grupo vocal feminino pioneiro na interpretação de samba:As Gatas (acima, em 2003). Formado pelas cantoras Dinorah (falecida em 2006), Nara, Zélia e Zenilda , o conjunto gravou todos os discos de samba desde 1968 e é responsável pelos corais nas faixas. Também são convidadas para auxiliar os intérpretes na avenida – a Beija-Flor, escola que elas desfilaram pela primeira vez em 1977 é a mais freqüente.
Em outros estados, a participação da mulher como puxadora de samba também é marcante. Em Porto Alegre, fizeram história as performances de Maria Helena MontierVitória Feijó e Mauriléia. Em São Paulo, a maior delas é a cantora Eliana de Lima(foto acima), que puxa sambas há 25 anos na capital paulista. Ela se consagrou em escolas como Unidos do Peruche e Leandro de Itaquera.                                                                 
            
- Tia Surica (Portela/66)
- Marlene (Império Serrano/72 e 73)
- Elza Soares (Mocidade/73, 74, 75, 76 e Cubango 2000)
- As Gatas (Dinorah, Nara, Zélia e Zenilda, pioneiro grupo vocal feminino de samba no Brasil, gravaram os discos de samba acompanhando várias escolas, como Beija-Flor/77)
- Ivete Garcia (Jacarezinho/73)
- Graciete (Império Serrano/73 – gravou no disco)
- Beth Carvalho (Mangueira/74 – gravou no disco)
- Clara Nunes (Portela/75)
- Dinalva (Salgueiro/76)
- Zaíra (São Carlos/80)
- Rutinha (Unidos de Padre Miguel/85 – gravou no disco)
- Simone (Tradição/89)
- Leci Brandão (Santa Cruz/95)
- Selma Reis (Mocidade/95)
- Alcione (Tradição/04 – gravou CD)
- Eliana de Lima (Peruche e Leandro de Itaquera-SP)
- Marisa Monte (portelense, ainda não cantou samba-enredo na avenida)

FONTE: SAMBARIOCARNAVAL.COM

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